Imagine uma ilha tropical exuberante, com vegetação densa, recifes de corais e vida selvagem, perdida no meio do Atlântico Sul — e que agora, milhões de anos depois, reaparece nas páginas da ciência e pode mudar os rumos do Brasil. Parece roteiro de filme, mas é real.
Pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) anunciaram a descoberta de uma antiga ilha submersa localizada a cerca de 1.100 km da costa do Rio Grande do Sul, em uma região conhecida como Elevação do Rio Grande (ERG). A revelação, publicada na prestigiada revista Nature, tem potencial para redefinir os limites do Brasil e ampliar sua zona de exploração marítima.
A Elevação do Rio Grande é uma gigantesca cadeia montanhosa submersa, com cerca de 500 mil km² — uma área maior que o Uruguai! Segundo os cientistas, essa região foi uma ilha tropical há cerca de 50 milhões de anos, durante o período Eoceno. O local abrigava solos férteis, semelhantes aos do interior paulista, e estava repleto de vegetação e vida marinha.
Hoje, essa antiga ilha está escondida sob as águas, em profundidades que chegam a 5 mil metros. Mas seus picos submarinos continuam lá, imponentes, chegando a até 4 mil metros de altura e ladeados por desfiladeiros gigantes, como o Canal da Verna, com até 50 km de largura.
As pistas dessa 'Atlântida brasileira' começaram a surgir em expedições realizadas em 2018 e 2019, quando cientistas coletaram amostras de argila vermelha a 650 metros de profundidade. Essa argila, rica em minerais como caulinita, magnetita, hematita e goethita, só se forma em solos tropicais expostos ao ar.
Ou seja, a Elevação do Rio Grande já foi terra firme — e afundou ao longo de milhões de anos, devido a eventos vulcânicos e acúmulo de sedimentos. A comprovação disso transforma o local de um mero ponto no mapa para um patrimônio geológico de valor histórico e estratégico.
Além do fascínio científico, a descoberta tem implicações econômicas e geopolíticas gigantescas. Se o Brasil conseguir provar que a ERG faz parte de sua plataforma continental estendida, poderá ampliar sua Zona Econômica Exclusiva (ZEE) no Atlântico Sul.
Na prática, isso significa mais território marítimo para explorar recursos minerais estratégicos, como ferro e manganês — fundamentais para a indústria moderna —, além de reforçar a presença brasileira em águas internacionais, numa área com enorme potencial econômico e ambiental.
A pesquisa envolveu uma equipe multidisciplinar e contou com o apoio de instituições internacionais, como a University of Southampton, no Reino Unido. Foram utilizadas tecnologias de ponta, como veículos submarinos autônomos, robôs operados remotamente e mapeamento batimétrico de alta precisão.
A descoberta da ilha perdida reacende debates sobre os limites do país, o potencial inexplorado do nosso litoral e a necessidade de preservação dos recursos submarinos. E mais do que isso, mostra que o oceano ainda guarda mistérios profundos capazes de reescrever a história do planeta.
O Brasil, ao que tudo indica, acaba de encontrar um pedaço esquecido de si mesmo — e ele estava escondido no fundo do mar.